sábado, 7 de novembro de 2009

Alice e o Rei

"Agora está sonhando", observou Tweedledee. “Com que acha que ele sonha?”
Alice disse: “Isso ninguém pode saber.”
“Ora, com você!” Tweedledee exclamou, batendo palmas triunfante. “E se parasse de sonhar com você, onde acha que você estaria?”
“Onde estou agora, é claro,” respondeu Alice.
“Não, não!” Tweedledee retrucou, desdenhoso. “Não estaria em lugar algum. Ora, você é só uma espécie de coisa do sonho dele!”
“Se o Rei acordasse”, acrescentou Tweedledum, “você sumiria... puf!... exatamente como uma vela!”
“Não sumiria!” Alice exclamou indignada. “Além disso, se sou só uma espécie de coisa no sonho dele, gostaria de saber o que vocês são?”
“Idem”, disse Tweedledum.
“Idem, ibidem”, gritou Tweedledee.
E gritou tão alto que Alice não pode se impedir de dizer: “Psss! Receio que vá acordá-lo se fizer tanto barulho.”
“Bem, não adianta você falar sobre acordá-lo”, disse Tweedledum, “quando não passa de uma das coisas do sonho dele. Você sabe muito bem que não é real.”
“Eu sou real!” disse Alice e começou a chorar.
“Não vai ficar nem um pingo mais real chorando”, observou Tweedledee. “Não há motivo para choro.”
“Se eu não fosse real”, disse Alice – meio rindo por entre as lágrimas, tão absurdo aquilo tudo parecia – “não conseguiria chorar.”
“Espero que não imagine que suas lágrimas são reais!” Tweedledee interrompeu-a, num tom de profundo desdém.


- GARDNER, Martin ; CARROLL, Lewis. Alice, edição comentada. Ed. Jorge Zahar: Rio de Janeiro, 2002.




(foto de Elene Usdin)