domingo, 14 de junho de 2009

A mandíbula pensa

Ele vai destravar o medo e liberar a fala. Ele está com a grande quantia do dinheiro trabalhado e vai até o consultório. As escadas frias, as paredes estreitas, a porta de vidro. Os homens brancos de luvas e touca estão sabendo que procedimento tomar, a anestesia o acalmará momentâneo. Feltro para proteger do sangue que irá escorrer. O lacrimejar. Há força, força para extrair, para chegar no ponto certo, no osso no caso. Ele nem imagina, ele não vê alternativa melhor para aliviar a dor. Ele precisa livrar a trava, a fala, os pensamentos do bloqueio infantil, o trauma de mamar será mordido. As mãos suadas apertam o ar seguram o pavor num desejo de que o tempo volte, passe, retire dele si mesmo, seus membros, seus ossos, o medo de falar será deglutido.
Agora ele vai poder dizer, xingar, se manifestar. No trânsito, em qualquer lugar. Todos vão entender. Não estará sozinho na cidade, inteiro sabiá. Sílaba por sí la ba a língua verá como a íris de um olho da verdade, a boca se abre e toda a vida se revelará. Ele está salvo. Ainda inchado, desce as escadas com o algodão enxarcado de sangue a saliva na boca. Na rua olha o sol entre as nuvens em feixes, e como um raio de luz querendo passagem, abre a boca admirado: ele agora sorrirá!


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